Tons de saudade não têm cor, têm aroma. Hoje pela primeira vez desde bom tempo olhei pro céu como quem navega e não se afoga. Me veio a fé em afago forte, sem medo da escuridão que invade o véu de nossos crepúsculos. Hoje lembrei de iluminar o caminho. Senti…

Naquela noite em que fugimos do sereno que queria invadir nossa casa, eu cantei uma melodia triste que mesmo em meu silêncio tu conseguiu ouvir. Não sabia ainda daquela língua particular por entre espaços da fala. Devo ter exagerado na entonação de muitos hiatos. Minha quietude escandalosa. Tu me leu…

Gosto do gosto da tua poupa na minha boca. Sabor de tecido de fábrica, especiaria fina. Alimento que se consome aos poucos, de rigor e bom garbo, saboreando toda textura de aroma, admirando o ponto do fogo e da luz. Tua doçura desnuda até gosto agudo as vezes que tua…

Na raiz do medo não há água, é seco Como os olhos de quem machuca por querer. Já quis muito ser herói. No universo das histórias a maldade Faz sentido. Criança não morre. Não ter medo é enxergar quem vem lá. Constatei que o mundo me contava coisas Na voz…

quando lágrimas coagulam no leito dos olhos a visão se torna restrita a dor turva deturpada dura como o titânio quebra o osso e então afixa fazendo dele mais rígido mais forte do que era antes o homem engessado emocionalmente limitado afetivamente frustrado despreparado e imaturo um jovem adulto ou adulto…

Baseado no conto homônimo de Franz Kafka. — Diante da lei há o leito e a luta. Diante da lei há a garganta e o choro. Diante da lei há um guardião epônimo. E ele nunca abandona o seu posto. À lei cabe perpetuamente prevalecer. Se diante de alguns prevarica assunto é porque para a lei atenção tem…

A noite nunca dormiu. Ela mora em meus olhos. Havana como minhas retinas repletas de luar. Fractal, prismática, luminante. Factual e irrelevante. Leva tudo e deixa toda coisa. Se deita sobre superfície fragosa. Descansa em planícies plácidas. Procura fora refletir o dentro. Envida dentro entender o fora. Larga aos cantos…

A luz do quarto aguça o transe. Projeta sobre as paredes sombra da palavra. Verbo de primeira pessoa do presente do conjuntivo. Verbo de terceira pessoa do presente do imperativo. Eu. Ela. Nós. Em transe. O transe é perfume cujo aroma exala das horas. Primordialidade espúria de tentar capturar o…

Hipócrita leitor, meu igual, meu irmão. — Cuida bem do que eu te dou, porque é o fôlego dos meus pulmões. Te dou o sangue que aquece os meus ossos. Te dou alma, ainda que isso se dê sem que se perca. Poeta não clama por respeito. Poeta é devoto do céu imaterial. …